Anticristianismo como resistência

29/07/2018

Na colônia, ciganos e negros também eram acusados de maltratar as imagens sagradas. A partir de um caso de injúria aos santos da "preta Rosa Gomes" (Nas minas setecentistas o caso de Rosa Gomes, negra e forra desesperada e fora de si, arrancou de seu corpo as contas e os bentinhos, quebrou com um machado as imagens de Nossa Senhora e santo Antonio e arrancou os braços e a cabeça do menino Jesus (VAINFAS; SOUZA, 2000, p.34) podemos adentrar um pouco no universo do anticristianismo entre os negros, escravos ou forros. A posição da Igreja diante dos escravos africanos não diferia muito em relação aos indígenas. Partindo do princípio das desigualdades naturais entre as raças, a Igreja buscou legitimar a escravidão como meio de conversão. Muitos padres do Brasil Colônia, entre eles Antônio Vieira, viam na ação portuguesa um bem, pois os negros desterrados da África encontrariam no Brasil a salvação de suas almas pelo catolicismo. O discurso católico uniformizador buscou apagar as diferenças. Só posteriormente, depois de convertidos, os negros encontraram meios de inserção nas instituições católicas.

As mulheres cristãs-novas eram muito visadas pela inquisição. Num contexto marcado pela tradição oral, onde o Index era a referência do que não devia ser lido, especialmente a Torá ou o Talmud, às mulheres cabia a transmissão da cultura judaica através das sucessivas gerações. "Os Inquisidores consideravam as mulheres como um dos maiores perigos para a sociedade católica, uma vez que acreditavam que o Judaísmo era transmitido às novas gerações pelo sangue, pela memória feminina.

As primeiras manifestações de resistência anticristã são encontradas nas práticas culturais indígenas da sociedade colonial. Como era esperado, o cristianismo católico, que veio à bordo do projeto colonial ibérico, encontrou uma série de resistências entres as sociedades indígenas secularmente instaladas e estruturadas nas áreas coloniais.

Animados pelo espírito do Concílio de Trento, os jesuítas viam nos gentios ou negros da terra possíveis convertidos a engrossar as fileiras católicas. Todavia, os processos de conversão e inculcação do cristianismo não foram sempre pacíficos e bem sucedidos. Os indígenas resistiram em nome de sua cosmologia religiosa e até assimilaram elementos ibéricos aos seus cultos, profanando-os ou atribuindo-lhes outro sentido, em outras palavras, mestiçando-os.

As epidemias epidemias reforçaram o poder dos pajés e a hostilidade aos sacerdotes católicos. Ronaldo Vainfas, em Heresias dos Índios, afirma que "os curandeiros indígenas diziam, então, que o 'batismo matava', e não deixavam de ter alguma razão ao dizê-lo". O impacto da colonização reforçou a busca da Terra sem Mal, os massacres, as doenças, a escravidão e o cativeiro funcionaram como elementos impulsionadores nos discursos dos profetas índios para a busca da morada dos ancestrais. "A própria busca da Terra sem Mal, mensagem central na pregação dos profetas índios, absorveria, com o passar do tempo, significados fracamente anticolonialistas e anticristãos". (VAINFAS, 1995, p. 46, in: de SOUZA; FABRICIO, p.22)

Durante o período de implantação da base econômica da colônia com a introdução da lavoura, muitos indígenas foram submetidos ao regime de escravidão. Os indígenas não aceitaram pacificamente o domínio português. Pelo contrário, aumentaram as hostilidades, os assaltos aos núcleos coloniais. No entanto, não foi apenas através do signo da violência física que o projeto colonial se efetivou, é preciso lembrar que a inculcação do cristianismo pela catequese foi a dimensão simbólica dessa violência.

Aos indígenas, gradualmente, foram ensinados os ofícios cristãos, os sacramentos, a disciplina em torno dos horários e do trabalho, a rejeição pelos costumes tradicionais, a condenação da nudez, o constrangimento da culpa e do pecado.

Mas não apenas a escravidão, os massacres e o cristianismo trouxeram os portugueses, com eles também vieram as doenças, sendo a varíola a mais mortífera. Não é fortuito que o discurso profético de resistência anunciasse uma Terra sem Mal como lugar da imortalidade.

Referências:

SOUZA, Rogério Luiz; FABRÍCIO, Edison Lucas. O anticristianismo no Brasil. REVISTA DE ESTUDOS DE CULTURA | Nº 01 | Jan.Abr./2015

VAINFAS, Ronaldo; SOUZA, Juliana Beatriz de. Brasil de todos os Santos. Rio de Janeiro: Jorge Zahar Ed., 2000.


Contato: vivianedmoreira@hotmail.com 
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