Lourença Coutinho
Lourença
Coutinho condenada pela Inquisição por judaísmo. Nasceu em 1679, na
cidade do Rio de Janeiro, filha de Baltasar Rodrigues Coutinho, senhor
de engenho em São João do Meriti (RJ). Pertencia a uma família de
cristãos-novos estabelecida no Rio de Janeiro desde meados do século
XVII. Lourença casou-se com o advogado e dono de plantações de cana João
Mendes da Silva, formado em Coimbra em 1691, com quem teve seus filhos
Baltasar, André e Antônio José. O caçula, Antônio José da Silva,
escreveu A guerra do alecrim e da manjerona, um clássico das literaturas
barroca portuguesa e brasileira, e passou à história com a alcunha de
"o Judeu". Em 1712 Lourença foi presa pela Inquisição e levada a Lisboa
para interrogatório. Seu marido deixou as propriedades e, com os filhos
do casal, acompanhou a mulher a Portugal. Em Lisboa, Lourença foi
submetida a torturas e assistiu ao Auto da Fé realizado no Largo do
Rocio, no dia 9 de julho de 1713. Tinha, então, 47 anos. Durante o longo
ritual, os condenados permaneciam perfilados e expostos ao achincalhe
de populares reunidos em volta do Largo. Eram também obrigados a manter
aceso nas mãos um círio de mais de um metro. À medida que a cerimônia
ia-se desenrolando, gotas ardentes de cera iam queimando as mãos dos
acusados. Em 1726 Lourença voltou a ser denunciada. Foi presa junto com
seu filho mais novo, Antônio José. Mãe e filho foram torturados e
interrogados pelo Tribunal do Santo Ofício e submetidos ao Auto da Fé no
dia 13 de outubro de 1729. A sentença foi publicada em 16 de outubro
daquele ano. Antônio José foi libertado, mas mantido sob observação,
enquanto sua mãe, Lourença, foi condenada a novo degredo por três anos
na vila de Castro Marim, situada na região do Algarve, sul de Portugal.
Libertado, Antônio José voltou a exercer a carreira de advogado e se
casou com Leonor Maria Carvalho, de origem espanhola, que também já
havia sofrido uma investigação do Santo Ofício. O casal teve uma filha
chamada Lourença, em homenagem à avó. No dia 12 de outubro de 1737,
Lourença, seus ilhos e sua nora Leonor foram novamente presos pelo Santo
Ofício e submetidos a torturas. Lourença estava viúva e a denúncia
tinha sido feita por sua escrava Leonor Gomes. As acusações da escrava
eram de que Lourença praticava o judaísmo, jejuava aos sábados e "no dia
grande do mês de setembro", passava o dia sem comer nem beber, ceando
coisas que não eram carne. Esse terceiro processo sofrido por Lourença e
seus filhos foi presidido pelo inquisidor Philippe Maciel. Depuseram,
além de Leonor Gomes, mais quatro pessoas. A escrava chegou a fazer
cinco depoimentos. A defesa de Lourença foi de que sua escrava não
merecia crédito, era desobediente, soberba e tratava mal seus netos,
além de furtar para dar aos homens. O que a escrava queria mesmo era a
liberdade. De fato, Leonor era escrava, havia 18 anos, da família de
Lourença e queria ser alforriada ou, em última instância, vendida ou
posta ao ganho. A liberdade de Leonor Gomes era a razão da guerra surda
entre as duas. Nessa disputa, Leonor associou-se a outros serviçais
tanto da família quanto das vizinhanças, para, através da perseguição
implacável do Santo Ofício aos cristãos-novos, fazer sua vingança
pessoal contra sua senhora. Lourença foi novamente condenada, além de
ter que pagar as custas do processo. Seus filhos também foram submetidos
ao Auto de Fé. Antônio José foi condenado ao garrote e à fogueira;
André também foi condenado, mas não se conhece a sentença. Leonor, a
nora, e ela própria foram condenadas à pena de prisão perpétua em
cárcere.
Fonte: SCUMAHER, Schuma; BRAZIL, Erico Vital. Dicionário Mulheres. Rio de Janeiro: Zahar, 2000. pp. 536